GENGIS KHAN - O SENHOR DOS TRONOS E COROAS

A seguir, um artigo resumido sobre Temugin, mundialmente conhecido como "Gengis Khan", que já fora proclamado 'o senhor dos senhores', entre outros epítetos que remetiam à sua destreza e habilidade bélica. Em meio à invasões, pilhagens e massacres sob seu comando de ferro, Gengis não poupou nem mediu esforços e derramamento de sangue em prol da unificação e expansão do império mongol. O texto se inicia destacando uma das tribos nômades mais notáveis e poderosos dos mongóis, os tártaros, um dos poucos povos guerreiros a enfrentar com bravura os exércitos implacáveis do 'guerreiro perfeito'.

Gengis Khan, Museu do Palácio Nacional em Taipei, Taiwan



Os Temíveis Tártaros

Cavalaria Tártara


Exércitos derrotados. Cidades em ruínas. Lavouras devastadas. Pilhagens e massacres. Eram essas as notícias que chegavam da longínqua Rússia à Europa Central, durante o século XIII.
Em 1237, os tártaros ultrapassaram o Volga. Em 1239 foi a vez de Dnieper. Dois anos depois, em 1241, levaram de roldão as defesas que guarneciam a Polônia e a Hungria, e invadiram seus territórios, sempre cometendo toda sorte de atrocidades. No ano seguinte, as vítimas foram outras: Eslovênia, Croácia, Dalmácia, Sérvia e Bulgária. E, em todos esses países, os asiáticos deixaram atrás de si um rastro de mortandade e destruição.

De repente – assim como tinham surgido – eles se retiraram para a região dos montes Urais e deixaram a Europa em paz. Mas por muito tempo ainda o Ocidente tremeu à simples lembrança daqueles guerreiros que vinham da Mongólia. Poucos lugares do mundo são mais desolados e inóspitos do que as geladas estepes mongólicas, uma imensa região que abrange a maior parte da Ásia Central. Seu solo árido é varrido o ano inteiro por ventos cortantes, de modo que não há cultivo: a lavoura ali é impraticável. Foi nessa terra seca, entretanto, que surgiu um dos povos mais importantes da História. 

Os homens de olhos estreitos eram baixos, mas atarracados, o que lhes faltava em altura, sobrava-lhes em energia: curtidos pelo clima rigoroso e acostumados desde cedo às grandes cavalgadas, demonstravam na guerra uma resistência e uma perícia como cavaleiros que assombravam seus adversários. Além disso, manifestavam uma agressividade tão excepcional que, diante deles, dificilmente qualquer inimigo conseguiria resistir. Os chineses, já muito civilizados, referiam-se depreciativamente aos mongóis como “a raça dos porcos”. Mas, apesar da Grande Muralha que ergueram para se proteger deles, acabaram caindo sob o domínio dos ferozes homenzinhos das estepes. Estes se dividiam em várias tribos, mas falavam dialetos muito semelhantes. E levavam uma vida de forma também muito parecida, pois a esterilidade da terra forçava-os ao nomadismo; o pastoreio era o único meio possível de sobrevivência.


Gradualmente, porém, tanger gado de pastagem em pastagem deixou de lhes parecer satisfatório. Muito melhor era a vida que levavam os habitantes dos países civilizados que bordejavam as estepes. Em vista disso, os pastores passaram a se agrupar nas vizinhanças dos povos de que tinham inveja. Não tardou muito, começaram a ataca-los: sempre sem aviso, sempre com violência e sempre com bons resultados. Suas invasões faziam fugir as populações agrícolas, cujas terras, abandonadas, acabavam servindo de pasto para a população dos mongóis.

Lanceiros mongóis atacando a cavalaria chinesa da dinastia Song, ou Sung, que governou a China dos anos 960 a 1279 d.c. 



Mongóis, todos aqueles homens eram. Mas, entre várias tribos, havia uma que se chamava tata e, como existia em grego uma palavra muito parecida – tartar, que significava Inferno -, os europeus passaram a chamar de “tártaros”, ou seja, “infernais”, a todos aqueles demoníacos guerreiros que vinham da Ásia Central.

Durante muito tempo, as inúmeras tribos mongólicas viveram cada qual por sua conta, suas crenças comuns, sem unidade política e sempre às turras umas com as outras. Foi somente por volta de 1167 que nasceu um homem que unificaria o povo mongol. Chamava-se Temugin e começou cedo sua carreira de conquistador: após retomar a mulher que lhe havia sido tomada durante um saque sofrido por sua tribo, mudou o nome para Gengis e lançou-se a uma série de campanhas que o tornaram senhor de todas as tribos vizinhas. Em 1206, os grupos que submetera já eram tantos que foi proclamado ‘Khan’, - Senhor de todos os senhores. Sete anos mais tarde, seus 200.000 cavaleiros tomaram conta do norte da China. E pouco tempo depois partiram para dominar os turcos localizados na Ásia Menor, bem como vários principados da Rússia.

O comando inteligente e a unidade imposta pela disciplina moldaram um novo povo mongol. E as vitórias se sucederam. A tal ponto cresceu a fama dos exércitos de Genghis Khan, que as forças inimigas se curvavam ao seu poderio sem esboçar resistência. Seu império, construído à força foi, em toda a História, o maior conquistado por um só homem. Genghis Khan deixou como herdeiro seu filho Ogodai. E este ampliou ainda mais os domínios dos mongóis, já agora reconhecidos como demoníacos, ou tártaros. Para isso, valeu muito a ajuda de seu sobrinho – Batu Khan -, cujo talento militar levou os tártaros Rússia adentro, até ocupar Moscou e Kiev. E mais: a Geórgia, a Armênia, a Bulgária, a Ucrânia, a Polônia, a Morávia, a Hungria e a Croácia.

A entronização de Gêngis Khan em 1206, sendo proclamado "Khan-khan", ou "Khagan", de todos os mongóis. Ilustração de um manuscrito , "Jami 'al-tawarikh". O "Jāmiʿ al-tawārīkh," é uma obra de literatura e história, produzida no *Ilcanato mongol na Pérsia. Escrito por Rashid-al-Din Hamadani (1247-1318) no início do século XIV, a amplitude da cobertura do trabalho fez com que ele fosse chamado de "a primeira história mundial". Era em três volumes. As porções sobreviventes totalizam aproximadamente 400 páginas, com versões em persa e árabe. O trabalho descreve culturas e grandes eventos da história mundial da China à Europa; além disso, abrange a história mongol, como forma de estabelecer seu legado cultural
*Ilcanato foi um dos quatro estados sucessores do Império Mongol, originários de sua fragmentação, e fica centrado na Pérsia. 


Recriação de um retrato de Ogodai Khan, filho de Gengis Khan, do século XIV 



Batu Khan não poupava despesas para sua tropa. Seus soldados tornaram-se requintados a tal ponto que acampavam em vistosas barracas de campanha enfeitadas de dourado. Evidentemente, a tenda de Batu Khan era ainda mais magnificente que as outras e, devido a esse gosto pela decoração, o exército tártaro ficou conhecido como “a Horda de Ouro”. Quando, mais tarde, o fabuloso império criado por Genghis Khan entrou em decadência, os tártaros da Horda de Ouro fixaram-se na Europa Oriental e, durante mais de duzentos anos, exerceram uma poderosa influência na Rússia.
O sucessor de Ogodai foi Kublai Khan, neto do “guerreiro perfeito”. Estudara com mestres chineses e tinha profunda admiração pela civilização daquele país. Tanto assim, que preferiu adaptar seu império à moda chinesa, abandonando o nomadismo que sempre caracterizou os povos mongólicos. Seu domínio, que durou 35 anos, foi todo ele dedicado a projetos pacíficos, entre os quais a eliminação da hostilidade que até então existira entre os chineses e os homens das estepes. O último dos grandes conquistadores tártaros chamava-se Timur-i-leng, ou seja – Timur, o Coxo. Mas os europeus acabaram por modificar-lhe o nome para Tamerlan ou Tamerlão.

Tamerlão

Alegando um parentesco remoto com Gengis Khan, Tamerlão reuniu um grupo tártaro que se tornou poderoso a ponto de enfrentar e derrotar a Horda de Ouro, em 1395. Chefiou seus exércitos numa invasão da Índia, durante a qual os tártaros fizeram uma pilhagem memorável. Tinha então mais de sessenta anos. Seu ânimo permaneceu forte até o fim: às vésperas dos setenta, resolveu invadir a China. Mas não conseguiu: morreu a caminho.

Com o passar do tempo, os tártaros foram pondo de parte suas tradições guerreiras. Hoje, depois de uma série de transformações políticas, constituem uma das várias nacionalidades que fazem parte da União Soviética (este texto foi originalmente escrito em 1977 antes do fim da União Soviética, em 1991; vide fonte ao final do texto). 

"Dança Tártara". Obra de Juliusz Kossak




Gengis Khan: O Imperador das Estepes e do Mundo

Busto de Gengis Khan na Mongólia adorna uma parede no palácio presidencial em Ulaanbaatar, Mongólia


Grande Matador, Guerreiro Perfeito, Senhor dos Tronos e Coroas, Imperador de Todos os Homens – esses foram alguns dos títulos com que passou à História um mongol chamado Temugin, nascido por volta de 1167, e quem em seus sessenta anos de vida conseguiu criar um império ocupando metade do mundo então conhecido. Mas o nome pelo qual Temugin se tornou realmente famoso é Gengis Khan.

A lenda fez de Gengis Khan um déspota sanguinário. Mas se a lenda não é falsa, pelo menos é incompleta: apesar das execuções e massacres que comandou, Gengis Khan deve ser lembrado também pela extraordinária proeza de unificar os mongóis – um povo nômade e antes dividido em dezenas de tribos e clãs. Quando ele nasceu, as tribos mongóis eram governadas por algumas famílias que de vez em quando conviviam pacificamente, mas em geral dedicavam a maior parte do tempo a combater-se. Uma tribo sujeitava a outra, roubava seus rebanhos e outros bens, incluindo nestes as mulheres.

E assim foi que, por volta de 1196, a tribo dos Merkitas saqueou o acampamento do clã dos Borgigin e tomou a mulher de um de seus membros mais ilustres. O marido ultrajado resolveu ir à desforra: fez aliança com outra tribo e lançou-se à luta. E venceu. Retomou sua esposa, ganhou muito prestígio e foi nomeado chefe da tribo. Também mudou de nome: de Temugin para Gengis – palavra que significa, em idioma mongol antigo, inflexível. Atacou os terríveis tártaros, vencendo-os, e ganhou também as simpatias da dinastia Chin que reinava na China setentrional, ou seja, ao sul das terras mongóis, e que também era constantemente ameaçada pelos tártaros. Dominadas, pouco a pouco, todas as tribos mongóis, Gengis Khan decidiu legalizar seu poder.

Moeda dos Grandes Khans mongóis cunhada na província Balkh (em português, Bactro), Afeganistão, em 1221 d.c. 




Em 1206, reuniu um grande kuriltai – assembleia geral das famílias nobres dessas tribos -, que o proclamou “Khan-khan”, senhor dos senhores, ou seja, chefe supremo. A assembleia toma a decisão de unificar as tribos e clãs numa única nação, vasta e potente, que recebe o nome de Estado Mongol. Gengis Khan sentia-se como executor de uma missão divina: “Um único Sol no céu, um único soberano na Terra”, costumava dizer sobre si mesmo. Com esse objetivo, transformou a não desprezível força militar dos mongóis num verdadeiro exército nacional, estruturando-o sob seu comando pessoal. Reuniu os códigos de leis das diferentes tribos numa só constituição, o Jasak. E julgou que era chegada a hora da expansão.

Estátua de Gengis Khan em Ulaanbaatar, Mongólia

“Cuspir para o Sul”


Primeira meta: “cuspir para o Sul”, ou seja, em termo menos rudes, atacar a China. Foi uma guerra difícil, porque, de um lado, os mongóis desconheciam a técnica militar do assédio; do outro, a Grande Muralha barrava-lhes o caminho. A luta começou em 1213, dentro das cidades fortificadas. Por fim, Gengis Khan dividiu seus soldados em três exércitos que, ao mesmo tempo, atacaram em pontos diferentes, rompendo as linhas de defesa dos adversários. Matando e saqueando, submeteram quase todo o território chinês. Pequim ficou fora de alcance, mas os Chins tiveram de pagar ao exército invasor pesados tributos, que Gengis Khan levou consigo ao voltar à Mongólia.

Batalha entre guerreiros mongóis e os chineses (1211) 



Voltou – mas não sossegou. Em1215 lançou uma nova expedição contra Pequim e destruiu a cidade. Deixando aí seus generais, o Khan avançou para o oeste e conquistou no ano de 1218 o Império de Kara-Kitai, que se estendia por todo o Turquestão Oriental. Entre uma conquista e outra, Gengis Khan fundou a cidade de Karakorum, que se tornaria capital de suas imensas possessões. O lugar poderia ser mais ameno e não nos áridos altiplanos, onde as únicas águas eram as do lago Baikal, no curso do rio Orkhan. Mas o guerreiro perfeito não buscava amenidades, muito pelo contrário: seu alvo era manter vivo o amor pela conquista e cultivar as situações difíceis.



Influência Chinesa

Na construção de Karakorum, Gengis Khan contou com a assistência técnica de alguns chineses que se colocaram a seu serviço. E houve os que chegaram a ocupar importantes cargos no império mongol, ajudando a desenvolver seu comércio. Além disso, os mongóis adotaram táticas e instrumentos militares chineses, como, por exemplo, a catapulta, lançadores de lanças incendiárias e *bombardas. Ante esse potencial nenhuma cidade fortificada podia resistir.

*Bombarda encontrada no Castelo de Marbok na cidade de Marbok, na Polônia, construído em 1270 e concluído em meados de 1300 pela ordem dos cavaleiros teutônicos. A bombarda era um primitivo disparador de projéteis pesados que surgiu no século XIV (logo após a descoberta da pólvora pelos europeus), com bico pouco comprido, e que não passava de uma chapa de aço forjada em forma de tubo e reforçada com cintas metálicas. Pode-se dizer que a bombarda foi o precursor do canhão e do morteiro


Devido ao peso, foram criadas em 1365 as bombardas portáteis (ou bombardas de mão), as precursora das modernas armas de fogo portáteis. Estas eram mais leves e eram para ser utilizadas e transportadas por um só combatente; porém, assim como o arcabuz, não se podia mirar para baixo (pois a munição rolava para fora da arma). Estas últimas serviram de inspiração para o surgimento do arcabuz na entrada do século XV, cujo mecanismo de ignição estava mais próximo ao de uma espingarda moderna que ao de um canhão. 



Arcabuzes japoneses do século XVII (Fonte: wikipedia) 



Até então, Genghis Khan havia limitado suas ambições à Ásia Oriental. Mas um dia chegaram-lhe aos ouvidos lendas sobre terras ocidentais ricas e cheias de palácios e templos. O Khan resolveu investigar e mandou espiões disfarçados de mercadores ao império turco de Kharesm – que hoje corresponde ao Irã e Afeganistão.  O sultão desse império, Maomé II, não se deixou iludir: mandou decapitar os “comerciantes” mongóis. Gengis Khan soube da punição e planejou imediata represália. Em 1219 iniciou a travessia das grandes cadeias montanhosas que isolavam os povos da Ásia Central e Oriental das civilizações da Ásia Ocidental. Mas os guerreiros mongóis atravessaram o obstáculo e tomaram Kharesm de surpresa. Depois seguiram-se os outros grandes centros muçulmanos na Ásia Central e Ocidental: Otrar, Bocara, Samarcanda, Merv, Nichapur, Herat. Nesse meio tempo, o sultão morre e seu herdeiro foi banido para a Índia. 

Em 1221, vitorioso, Gengis Khan volta à Mongólia, deixando a dois de seus melhores generais – Chebe-Noyen e Subutai Bahadur -  a tarefa de continuar a marcha para oeste. A marcha foi triunfal: seus exércitos alcançaram o Mar Cáspio, no sul da Rússia, e subiram até a Criméia, pilhando os estabelecimentos que os negociantes genoveses ali haviam montado. Depois invadiram a Bulgária e chegaram ao mar Adriático, que banha as costas orientais da Itália. E mais ao norte chegaram até a Polônia.

Mongóis da Horda Dourada nos arredores de Vladimir, na Rússia, presumivelmente exigindo submissão, antes de saquear a cidade


A invasão mongol da Hungria: os mongóis desmontados, com mulheres capturadas, estão à esquerda; os húngaros, com uma mulher salva, à direita. Obra datada de meados de 1285 



Em 1227, durante uma campanha contra o remanescente do reino dos Tangout (último reduto independente nos domínios mongóis), Gengis Khan adoece gravemente e morre. Se, de um lado, foi a imensa e absoluta autoridade do Grande Khan que levou os mongóis a dispor de tamanho poder territorial, o mesmo motivo, de outro lado, precipitou o desmoronamento do império após sua morte. 
Com efeito, não houve quem conseguisse assegurar a continuação da unidade alcançada pela mão de ferro do mongol Temugin – o Genghis Khan. 

O portão do mausoléu de Gengis Khan na Mongólia Interior, China 


Mausoléu de Gengis Khan na Mongólia Interior, China


Estátua de Gengis Khan em seu mausoléu , na Mongólia Interior, China


Fonte bibliográfica: "Enciclopédia Novo Conhecer" Vol. VI, págs 1434, 1435, 1448 e 1449. Editora Abril Cultural, 1977 



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