O CÓDIGO DE HAMURABI (A provável origem da "Lei de Talião")
Atraídos pela fertilidade das terras banhadas pelos rios Tigres e Eufrates, os sumérios instalaram-se entre eles e o mar – atual golfo Pérsico, que então penetrava muito mais terra adentro. Não se sabe de onde vieram, embora haja quem supõe serem de origem ariano-hindu; isso ocorreu uns 4.000 anos antes da era cristã, e poucos são os rastros de origem daquele povo. Mas sabe-se, com certeza, que eles introduziram na região a escrita cuneiforme.
Os rios Tigre e Eufrates, em uma área chamada Al-Qurnah |
Foto da estela completa com o Código de Hamurabi com as leis gravadas em escrita cuneiforme. Tábua cuneiforme do Período Acadiano, 2000 a.c. Esta é uma adaptação da coleção do Instituto Oriental da Universidade de Chicago. Ao Sul do Eufrates, e beirando a
margem do golfo, habitavam os caldeus. Eram semitas e suas povoações chegavam
até o deserto árabe que parecia intransponível. Foi da cidade caldéia de Ur que
Taré decidiu empreender a longa viagem – seguindo a margem do Eufrates, pelo
norte, e não cortando o deserto, pelo sul - que conduziria seu filho, Abraão, à
terra de Canaã, conforme conta a bíblia. Do lado oposto do golfo vieram os
elamitas, com sua capital em Susa. Pelo ano 3.000 a.c. apareceram na região os
acadianos, também semitas, e estabeleceram-se na altura dos cursos médios do
Tigre e Eufrates. Mais uns dez séculos, e seguindo o rio Tigre, surgem os
assírios, com sua capital em Nínive. O Zigurate de Ur (também conhecido como Grande Zigurate de Ur). O zigurate é uma forma de templo, criada pelos sumérios e comum para os babilônios e assírios, pertinente à época do antigo vale da Mesopotâmia e construído na forma de pirâmides terraplanadas. (Wikipedia) Todos estes cinco povos convergem
em direção ao ponto de encontro natural de trocas e de contatos, formando uma
aglomeração urbana onde os rios Tigre e Eufrates quase que se tocam, de tão
próximos. Na cidade falam-se todas as línguas da região e elevam-se, em
homenagem aos deuses locais, altas torres. E tão rico e poderoso se torna o
lugar, que se justifica o nome dado por seus orgulhosos habitantes: "Bab-el" – a
porta de deus. O poder dessa cidade a levaria a englobar todos aqueles povos
sob seu comando. Houve, porém, tentativas de revolta. Assim, aproximadamente em
2.700 a.c., os elamitas insurgiram-se contra o domínio da Babilônia. Uns
quinhentos anos depois, deu-se a insurreição por certo tempo bem-sucedida dos
sumérios, que conquistaram dos acadianos a cidade de Babel e, consequentemente,
o poder. Pouco depois, os assírios rebelaram-se: anos mais tarde conquistaram
não só a Babilônia, mas muitas terras além. Quando, porém, mais ou menos em
1.800 a.c., Hamurabi sobe ao trono babilônico, a nação ainda é poderosa,
politicamente unificada ao redor da cidade de Babel e aparentemente submissa ao
monarca. Os 40 anos do reinado de Hamurabi marcarão, durante os 4 milênios
subsequentes, a evolução das leis e do conceito da justiça, não só entre o
Tigre e o Eufrates mas também em terras de cuja existência Hamurabi e seus
súditos nem sequer poderiam ter sonhado. Hamurabi surgiu na história como um guerreiro. Uma dinastia de usurpadores conquistou, sucessivamente, todas as regiões do império. Mas jamais conseguiu apoderar-se da própria cidade de Babel. De lá partiu a reação reunificadora. Dirigiu-a Hamurabi. De onde veio o próprio Hamurabi? Amu, entre os egípcios antigos, designava os povos semitas (até agora, em hebraico, a palavra am significa nação); urabi ou arabi designava os povos do deserto, os árabes. Fosse qual fosse a origem de Hamurabi, ele deu-se logo muito bem com o deus supremo local, Shamash (Samas), o deus-sol. Um baixo-relevo daquele período – atualmente conservado no Museu do Louvre, em Paris – mostra-o num colóquio bastante amigável com o deus, recebendo deste o que passaria à História como o “Código de Hamurabi”. E, uma vez que era aprovada pelo próprio deus, ninguém poderia desobedecer à Lei. Tabuleta de Shamash, 888-855 a.c. É uma tabuleta de pedra recuperada da antiga cidade babilônica de Sippar. Orelha contra
liberdade Presente nas leis de outros povos, o Código de Hamurabi
propriamente dito só foi descoberto em 1.901, embora se conhecesse sua
existência através dos relatos antigos, dos quais os de Beirosus (Beroso) – escritor
contemporâneo de Alexandre, o Magno – é o mais importante. O arqueólogo francês
Jacques de Morgan, encontrou o Código nos arredores da antiga Susa. Era um
cilindro de pedra negra, de 2,25 m de altura e 1,90 m de circunferência na base.
Morgan enviou os três pedaços originalmente achados ao Louvre, onde foram
reunidos e decifrados. São 46 colunas, 3.600 linhas de texto, 282 artigos –
escritos em caracteres cuneiformes -, cujo conteúdo visa a “implantar a justiça
na terra, destruir os maus e o mal, prevenir a opressão do fraco pelo forte,
iluminar o mundo e propiciar o bem-estar do povo”. Baixo-relevo de Marduk. Marduk, na religião mesopotâmica, o principal deus da cidade da Babilônia e o deus nacional da Babilônia; como tal, ele acabou sendo chamado simplesmente de Bel, ou Senhor. Depois de conquistar o monstro do caos primitivo, Tiamat, ele se tornou o Senhor dos deuses do céu e da Terra. Ilustração de Tiamat, deusa mesopotâmica do Caos, da Escuridão e do Sono. Tiamat é uma divindade ambígua que desempenhou um papel importante no mito da criação da antiga Mesopotâmia. Ela também era a personificação do mar primordial, do qual nasceu a primeira geração de deuses. O Código inicia-se com a apresentação da base de qualquer
justiça: “se alguém acusa um outro, mas não pode prová-lo, o acusador será
morto”. E “se alguém testemunha contra o acusado sem poder provar o que diz e
só o acusado for condenado à morte, a testemunha perderá a vida”. Até o juiz
que proferir uma sentença errada será “publicamente expulso de sua cadeira”. O
apego dos babilônicos à justiça só se igualou ao seu apego à propriedade – o
que era perfeitamente natural numa cidade enriquecida à custa do domínio
mercantil. Assim, o roubo de escravo – a única força que movimentava a economia
do império – será punido com a morte. Mas se um escravo diz ao seu senhor: “Não
sou seu escravo!”, terá a orelha cortada. E ficará livre. Só poderá salvar a
orelha sem perder a liberdade se conseguir comprá-la – para o que os templos
possuíam fundos especiais. O Estado era indiscutivelmente todo-poderoso, já que o próprio
imperador recebia seu poder dos deuses. Mas tinha várias obrigações. Por
exemplo: “se um ladrão rouba e não é preso, o que foi roubado deve expor,
diante dos deuses, tudo o que perdeu, e a cidade ou o governador da região que
habita deverá reembolsá-lo pelos bens perdidos”. Assim, instituía-se a
responsabilidade das autoridades pela proteção dos súditos do imperador. Aliás,
a responsabilidade de todos pelos atos cometidos individualmente parece ter
constituído a base da sociedade na época. “Se um arquiteto constrói para alguém
uma casa e não o faz solidamente, provocando um desmoronamento devido a defeito
de seu trabalho e causando a morte do proprietário, o arquiteto deve ser punido
com a morte”. Mas se o acidente matar o filho do proprietário, é o filho do
arquiteto que pagará com a sua vida. O que não era lá muito justo, mas obrigava
à execução perfeita dos seus compromissos profissionais. Em todos os setores. Há 3.600 anos,
salário mínimo em “gur” Apesar de serem diversos dos atuais conceitos da moral e da
família, o Código estabelecia como norma a proibição da venda da casa, do campo
e do horto – ou seja, dos bens da família – pelo chefe da casa, em detrimento
dos direitos dos familiares. Mas “se alguém negligencia no seu trabalho a
conservação de seu dique e nele se forma uma brecha, provocando inundação das
terras dos outros, este homem deverá dar em reparação o trigo que por causa
dele os outros perderam”. O Código instituiu até o salário-mínimo. “Se alguém aluga um
lavrador, deverá pagar-lhe anualmente oito gur de trigo. E “se alguém aluga um
agricultor mercenário, deverá dar-lhe seis se por dia”. Mas “se um homem é
encarregado de cultivar um campo e nele não semeia trigo, deve fornecer ao proprietário
do campo tanto trigo quanto tenha colhido o vizinho”. Todo um capítulo é
dedicado às difamações, prova-o este artigo 127: “Se alguém difama uma
mulher... e não o pode provar, deverá ser arrastado perante o juiz para lhe
marcar com ferro a face”. Aliás, a mulher era bastante respeitada na época. Não
se podia repudiar a esposa mandando-a embora, sem mais nem menos. A mulher
deveria receber uma garantia de sustento sob forma de “donativo de repúdio”.
Mas de qualquer forma não se podia repudiar a esposa enferma. “Se alguém toma
uma mulher e esta é colhida por moléstia, se ele então pensa em tomar uma
outra, não deverá repudiar a mulher presa por moléstia, mas deverá conservá-la
na casa e sustentá-la enquanto viver”. O Código também protegia o menor e instituía praticamente a lei do ventre livre. A adoção da criança era irrevogável. Mas “se o membro de uma corporação toma para criar um menino e não lhe ensina seu ofício, o adotado deve voltar para a casa paterna”. Contudo, “se ele lhe ensina o ofício, o adotado não pode ser mais reclamado”. Se o próprio pai “quer renegar o adotado, o filho adotado não deverá ir embora”. Antes, “deverá receber do patrimônio do pai um terço e do filho não adotivo um terço, e então ele deverá afastar-se”. O que obrigava um pai ingrato a pensar duas vezes antes de tomar tal decisão. Mas “se um filho espanca o pai, ser-lhe-ão decepadas as mãos”. E para dar ênfase às leis que promulgava, assim terminava Hamurabi seu Código: “Que cada oprimido apareça diante de mim como rei que sou da justiça. Possa ele folgar seu coração, exclamando: Hamurabi é um pai para seu povo, estabeleceu a prosperidade para sempre e deu um governo justo a seu povo. Por todo o tempo futuro, o rei que estiver no trono observará as palavras que eu tracei neste monumento”. Processo legal sumério contra uma criança escrava em escrita cuneiforme. Mas assim não foi, e já com Samsuilana, filho de Hamurabi, começou a decadência do império. Em 1.746 a.c, os cassitas invadem e conquistam a Babilônia e jogam no deserto a pedra que continha as leis eternas. 3.600 anos depois, será ali encontrada, no mesmo lugar onde deveria ficar sepultada para sempre, a fim de que os cassitas pudessem impor as suas leis. Mas os cassitas seriam conquistados pelos hititas, estes pelos assírios, e assim prosseguiu a História. Pedra "Kudurru" ("Marco") dos deuses sumérios e símbolos dos deuses do panteão babilônico. Datada de 1186- 1172. Museu do Louvre. Relevo de terracota da deusa alada Inana ou Ishtar. Inana é uma antiga deusa mesopotâmica associada ao amor, ao erotismo, a fecundidade e a fertilidade. Apesar de ser alvo de culto em todas as cidades sumérias, era especialmente devotada em Ur. Ela foi originalmente adorada na Suméria e mais tarde foi adorada pelos acadianos, babilônios e assírios sob o nome de Istar. Em sua homenagem, a sacerdotisa 'Enheduana compôs 42 hinos. Ela era conhecida como a "Rainha do Céu" e era a deusa padroeira do templo de Eana na cidade de Uruque, que era seu principal centro de culto. Ela estava associada ao planeta Vênus e seus símbolos mais importantes incluíam o leão e a estrela de oito pontas. Seu marido era o deus Dumuzi (mais tarde conhecido como Tamuz) e sua sucal (sukkal), ou assistente pessoal, era a deusa Ninsubur (que mais tarde se tornou a divindade masculina Papsucal). Influências Mesopotâmicas no Metal Extremo "Acheron - Lex Talionis". Álbum lançado em 1994. Em minha opinião, um dos melhores álbuns de Black Metal desta banda norte-americana em sua fase inicial e áurea, assim como do estilo como um todo, sendo este seu segundo álbum de estúdio. O nome do álbum é uma referência direta à "lei de talião" (lex talionis em latim). Na época, a banda contava com Vincent Crowley nos vocais, conhecida por ser membro ativo da Church of Satan (Igreja de Satã) e carregar dentro da mesma o título de "Reverendo". Vincent Crowley renunciou à Igreja de Satã dois anos após a morte do Anton Szandor LaVey, líder e mentor da mesma, em 1997, então ele não possui mais o título de "Reverendo". Ele fazia parte da formação original do Acheron, e se manteve na banda até o seu fim em 2019. Foto promocional recente de Vincent Crowley divulgando o single "La Muerte" de sua banda solo, cujo álbum é intitulado "Beyond Acheron". "Amen Corner - Jachol ve Tehila". Segundo álbum oficial de estúdio desta conhecida lenda do Black Metal nacional. Oriunda de Curitiba, Paraná, a banda lançou este álbum no ano de 1995, cujo título diferenciado significa "Poder e Glória" em hebraico. Este álbum marca o amadurecimento tanto musical quanto ideológico da banda, ainda que mantendo a mesma essência Satânica dos lançamentos anteriores, e mantendo a mesma linha cadenciada, sinistra e pesada que sempre caracterizou o som do Amen Corner. O álbum é conceitual sobre a temática mesopotâmica, e para mim é um dos melhores lançamentos do Black Metal nacional e mundial da década de 90. A banda chegou a dar uma parada nas atividades após o lançamento do ep "Darker in Quir Haresete" em 1999. A banda retornou à ativa em 2007 com o lançamento do álbum "Lucification", e se encontra na ativa até os dias atuais. "Zemial - For the Glory of Ur". Este é o álbum de estréia desta banda grega oriunda de Atenas, lançado em 1996. Apesar de pouco conhecida por aqui, acho este álbum excelente, levando a cabo um Black Metal com uma atmosfera densa e obscura em essência, muito bem executado e que remete às clássicas bandas gregas do estilo como Rotting Christ, Necromantia, Varathron e Kawir, mas com uma identidade própria e um estilo único e original. A referência a temas mesopotâmicos se faz presente em todo o álbum, desde o título do mesmo fazendo uma referência direta à antiga e lendária cidade suméria de Ur, até a capa do álbum, remetendo diretamente ao disco solar alado, que também é o emblema do deus assírio Ashar já mencionado acima no texto. A banda é composta somente por seu líder e mentor "Archon Vorskaath", e aparentemente a banda ainda está na ativa, mesmo tendo seu último lançamento no ano de 2016, o ep "The Repairer of Reputations". O nome da banda foi provavelmente inspirado no clássico filme de terror demoníaco "Warlock - O Demônio", de 1989 (ver o link do filme logo abaixo), no qual um demônio que se auto denomina "Zemial" incorpora em uma falsa vidente e ordena ao maquiavélico bruxo "Warlock", principal personagem do filme, que junte as páginas do "Grande Grimório", um livro separado em três partes com o poder de desfazer a criação. Link para o filme "Warlock - O Demônio": Warlock O Demônio Dublado - YouTube Principal fonte bibliográfica: "Enciclopédia Novo Conhecer", Vol. II. Editora Abril Cultural, 1977. Reprodução do texto: Éric Tormentvm Aeternvm XVI/XIII Outras fontes de pesquisa: "We Love Mesopotamia": We Love Mesopotamia | Facebook
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